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Origem da Escola de Enfermeiras do Hospital São Paulo, atual Escola Paulista de Enfermagem

Publicado: Sexta, 02 de Dezembro de 2022, 15h22 | Última atualização em Quinta, 15 de Junho de 2023, 22h56 | Acessos: 12564

 Uma iniciativa dos Álvaros - Guimarães Filho e Lemos Torres

Ouça acima o conteúdo deste artigo.

O processo [de criação da EEHSP] só foi concluído em março de 1939, por iniciativa de Álvaro Guimarães Filho [...] e do diretor Álvaro Lemos Torres.

O desejo de criar um centro para formação de enfermeiras de alto padrão nasceu praticamente junto com a própria Escola Paulista de Medicina (EPM). Na inauguração da sede definitiva, na Rua Botucatu, em outubro de 1936, Octávio de Carvalho, médico, professor e diretor da EPM, anunciara a intenção de criar a Escola de Enfermagem, anexa à Escola e ao hospital, para profissionalizar o serviço assistencial oferecido pela EPM. O processo só foi concluído em março de 1939, por iniciativa de Álvaro Guimarães Filho - que já havia criado o curso de Enfermagem Obstétrica, com 17 leitos, em outubro de 1938 - e do diretor Álvaro Lemos Torres. Eles entraram em contato com o arcebispo metropolitano de São Paulo, Dom Gaspar de Afonseca e Silva, que os apresentou a religiosas francesas da Ordem das Franciscanas Missionárias de Maria. Entre as freiras havia algumas enfermeiras capacitadas. E foi assim que as irmãs assumiram a Escola de Enfermeiras do Hospital São Paulo (EEHSP), atual Escola Paulista de Enfermagem da Universidade Federal de São Paulo (EPE/Unifesp), cujo currículo era idêntico ao da Escola Anna Nery, no Rio de Janeiro, pioneira no ensino de enfermagem no Brasil. 

 

“Aos 12 dias de fevereiro de 1939, na sala da Biblioteca da Escola Paulista de Medicina, na rua Botucatu, 720, na cidade de São Paulo, às 14 horas, reuniram-se o professor Álvaro Guimarães Filho, vice-diretor da Escola Paulista de Medicina e representando o Prof. Dr. Álvaro de Lemos Torres, diretor dela, o Prof. Dr. Pedro de Alcântara, representando a Congregação da Escola Paulista de Medicina, a Madre Maria de Saint Hermeland representando o Instituto das Franciscanas Missionárias de Maria, e a Madre Maria Domineuc, enfermeira diplomada desse Instituto, para deliberar sobre a fundação da Escola de Enfermeiras já em projeto e anexa à Escola Paulista de Medicina (...) de acordo com autorização dada pela Congregação da Escola Paulista de Medicina em 3 de outubro de 1938, deliberaram os presentes que os cursos da Escola de Enfermeiras se iniciassem no dia 1º de março próximo futuro, indicando para a direção interina ou contratada dessa Escola a Madre Maria Domineuc e confiando a orientação científica dos Cursos aos Professores da Escola Paulista de Medicina e a sua realização técnica às monitoras do Instituto das Franciscanas Missionárias de Maria. Foi finalmente resolvido que a administração e os cursos da Escola de Enfermeiras funcionassem em salas do prédio novo do Hospital São Paulo (...).”

 

 

aula inaugural

Aula inaugural em 14 de março de 1939 - A preleção que foi proferida pelo Prof. Álvaro Lemos Torres contou com a presença de elevado número de senhoras da nossa sociedade (Arquivo: acervo da EPE/Unifesp)

 

O objetivo da Escola de Enfermeiras do Hospital São Paulo (EEHSP) era oferecer educação profissional às pessoas com vocação à profissão de enfermeira. Tinha duração de três anos e adotava, como já referido, o padrão da Escola de Enfermeiras Anna Nery, da Universidade do Brasil.

Para o ingresso na Escola, era exigido das candidatas: certidão de nascimento, documentos que comprovassem ser brasileira ou naturalizada, atestado de vacina recente contra varíola e febre tifoide, certificado de ensino secundário (curso fundamental), atestado de idoneidade moral, no caso de viuvez, documentos comprobatórios, atestado do pai, responsável ou tutor apresentando a candidata, juntamente com um atestado médico e odontológico.

Na ausência de qualquer documento que pudesse comprovar que a aluna tivesse completado os estudos requeridos seria aceito um atestado de experiência anterior em serviço clínico, hospitalar, educativo ou comercial. Os pedidos de admissão eram dirigidos à diretora da Escola e, sempre que possível, pessoalmente. Caso a candidata não possuísse atestado ou diploma de curso fundamental poderia ser submetida a um exame preliminar perante uma comissão de três professores da Escola, exame esse constando das seguintes matérias: português, matemática, geografia, história do Brasil, física, química e história natural.

  

aluna de enfermagem

Adele Salvatori - aluna da EEHSP (Imagem; acervo da EPE/Unifesp)

 

Conforme mencionado em ata, no primeiro semestre letivo do curso (1939), matricularam-se 14 alunas no curso de obstetrícia e 2 no de enfermagem, sendo que deixaram de frequentar a Escola 5 alunas de enfermagem obstétrica. Segundo o Regimento Interno da EEHSP, as atividades práticas de enfermagem eram desenvolvidas no Hospital São Paulo, onde as alunas assumiam todo trabalho de assistência, durante as 24 horas sob supervisão das professoras religiosas. As aulas teóricas e teórico-práticas do ciclo básico, chamado preliminar, eram realizadas nas mesmas salas de aulas e laboratórios do curso médico. As consultas bibliográficas e estudos eram realizados em biblioteca específica da área, sendo que as alunas também utilizavam a do curso médico.

Os professores de medicina que ministravam as aulas para as alunas do curso de enfermagem demonstravam exigir destas o mesmo nível de conhecimento dos alunos de medicina. A Escola ainda oferecia cursos extracurriculares, tais como, geografia econômica, geografia humana, história das civilizações, história das artes, e da filosofia, religião e promovia atividades culturais como concertos musicais, conferências sobre assuntos gerais, entre outros.

 

Formação profissional e Diretrizes

A formação profissional das alunas era dirigida pela Escola Paulista de Medicina e realizada pelas religiosas, que tinham inteira liberdade a este respeito. A nova Escola, em conformidade com o Decreto nº 20.109, de 15 de junho de 1931 do Governo Federal, e de acordo com as leis da EPM, considerava os programas do curso, que seriam obrigatoriamente os oficiais, para que os diplomas fossem reconhecidos pelo Governo

Desde 1939, com o funcionamento do novo curso, as diretrizes gerais mantiveram o rigor por parte das religiosas franciscanas, tanto na formação como na fiscalização da moralidade das alunas matriculadas no que dizia respeito a comportamentos, hábitos, atitudes e valores. As alunas moravam na escola, em regime de internato, e passavam visitas no vizinho Hospital São Paulo, acompanhando os catedráticos de medicina. Bolsistas, as futuras enfermeiras graduadas recebiam ajuda financeira para estudar. Como contrapartida, ficavam à disposição do hospital 24 horas por dia. Se alguma plantonista do hospital faltava, uma das alunas era chamada para substituí-la. O chamado emergencial não tinha hora para chegar, podendo ocorrer até mesmo de madrugada. Era exigido rigor acadêmico nas disciplinas, sendo valorizado o estudo e a aquisição de cultura geral. Nesse contexto, foi criada uma biblioteca especializada em enfermagem junto às instalações da Escola.

O perfil proposto baseou-se na competência, nos valores éticos, morais e espirituais que deram o lema inscrito no emblema da Escola “Non vivere nisi ad serviendum” - Não viver senão para servir. Esse perfil caracterizou a enfermeira e a aluna que colocava assistência como prioridade em relação a qualquer outra atividade da vida profissional ou particular e para reforçar esse perfil, foi decidido que somente enfermeiras formadas nessa escola ocupariam cargos de chefia das unidades do hospital e de professores da escola.

 

logo eehsp

O lema inserido no emblema da EEHSP representava o perfil desejado para as enfermeiras e docentes da Escola a partir de estudo realizado em 1943 pelas madres e alunas recém-formadas. Tinha por base a competência e os valores éticos, morais e espirituais, a partir dos quais se colocavam a assistência do paciente com prioridade em relação a qualquer outra atividade da vida profissional ou particular. (Imagem: Paola - EPE/Unifesp)

 

Direção e Formatura da 1ª turma

No mês de novembro de 1939, o Conselho Diretor da EEHSP reuniu-se para designação da diretora efetiva da escola. Para esse cargo, foi sugerido o nome de Madre Maria das Dores, do Instituto das Franciscanas Missionárias de Maria, cujo nome civil era Lygia Rabello Dias, enfermeira diplomada pela Escola Anna Nery, satisfazendo plenamente as exigências do regulamento da escola, em que a votação foi unanimemente aprovada. Nesse mesmo mês, D. José Gaspar de Afonseca e Silva, arcebispo metropolitano, visitou a Escola e parabenizou os diretores pelo desenvolvimento da mesma.

As primeiras alunas, matriculadas nas turmas de 1939 A e 1939 B que receberam o diploma foram: D. Adele Salvatori, D. Francisca de Barros (Irmã Aurora Maria), D. Gabrielle Caron (Madre de São Domício), D. Maria Perroni (Irmã Benigna Maria) e a senhorita Jacyra Monteiro. A cerimônia de colação de grau das enfermeiras transmitia uma certa mística seguindo um modelo da sagração dos cavaleiros da Idade Média. Na véspera da formatura, havia o que se chamava “vigília das armas”, que era presença ininterrupta de duas alunas na guarda do Santíssimo Sacramento, o que terminava com a missa solene que precedia a colação.

 

Pasta 15 Foto 09

"E nós, fundadores que éramos de uma faculdade médica, sentíamos que o nosso programa ficaria incompleto se a está não agregássemos desde logo uma Escola formadora de enfermeiras. E o nosso plano entrou em germinação. Mas neste passo intervêm uma colaboração estranha. Estranha e rigorosamente providencial. Se, de um lado, nós, da Escola, nos interessávamos pela face técnico-científica da enfermagem, outra entidade havia em São Paulo (e esta inspirada por nada menos de vinte seculos de passado) que se preocupava com o aspecto espiritual da profissão. Sua Excelência Reverendíssima, D. José Gaspar de Afonseca e Silva, Arcebispo Metropolitano, cujo nome todos pronunciamos com respeito e cuja atuação se distribue pelos horizontes da mais ampla visão social, percebera a necessidade de consolidar, em nosso meio, a tradição hospitalar dos primórdios do cristianismo, absorvendo, porém, na forma católica, as diretrizes concretas da ciência médica. Por nós, queríamos enfermeiras hábeis e cultas. D. José, entretanto, vendo de mais alto, sentia que a técnica e o saber, quando não se põem ao serviço de um propósito superior, claramente revelado à consciência, são estéreis e vãos. Do consórcio dos dois programas - um significando a destreza cultivada, outro representando a chama de um ideal de perfeição ética - nasceu, em 1939, a Escola de Enfermeiras do Hospital São Paulo. Tentar-se-ia em vão, meus senhores, explicar-vos como se deu, no tempo e no espaço, a interseção das duas trajetórias. Quanto a mim, nem sequer tenho o direito de falar-vos em milagre." Prof. Antônio de Almeida Júnior - formatura: 17-09-1942 (Texto extraído do quadro localizado na EPE/Unifesp e Imagem: acervo iconográfico CeHFi/Unifesp)

 

Fontes:

A Universidade da Saúde - Escola Paulista de Medicina 70 anos (1933-2003)

Memórias do Cuidar - 70 anos da Escola Paulista de Enfermagem - Márcia Barbieri e Jaime Rodrigues

II A Escola Paulista de Medicina: entre tradição e modernidade (1933-1956). Ana Lúcia Lana Nemi

 

Este artigo faz parte do "Memórias do Campus São Paulo" - clique aqui para acessar outras postagens e conhecer este projeto.

 

 

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