Inquérito conduzido por docentes da Unifesp revela disparidades socioeconômicas e destaca a...
Estudo pioneiro do PPG em Urologia avalia métodos de tratamento em pacientes com próstatas de grande volume
Trata-se do primeiro estudo com intenção de avaliar parâmetros urodinâmicos como desfecho primário em pacientes com próstatas > 80 cm³
O estudo pioneiro coordenado pelo pesquisador Bruno Rodrigues Lebani, doutorando do Programa de Pós-graduação em Urologia da Escola Paulista de Medicina, Universidade Federal de São Paulo (EPM/Unifesp), sob orientação do docente Fernando Gonçalves de Almeida, concluiu que "a embolização de artérias prostáticas (PAE) é um método inferior ao padrão ouro para o tratamento da obstrução infravesical em pacientes com próstatas de grande volume (> 80 cm³), uma vez que não reduz de forma satisfatória os parâmetros pressóricos durante a micção. Da mesma forma, não se observou redução significativa de eventos associados a obstrução (hiperatividades detrusoras) no grupo experimental. Entretanto, consiste em alternativa para o tratamento da hiperplasia prostática benigna (HPB), uma vez que promove melhora satisfatória dos índices de Escore Internacional de Sintomas prostáticos (IPSS), leva a incremento do pico de fluxo urinário com redução do resíduo pós-miccional, além de baixo índice de complicações".
“Considerando as evidências atuais, não há estudos prospectivos e randomizados comparando a embolização de artérias prostáticas (PAE) ao tratamento padrão ouro para próstatas de maior volume."
A tese “Ensaio clínico randomizado comparativo entre Embolização de Artérias prostáticas e Prostatectomia Aberta em próstatas de grande volume (>80 ml): análise clínica e urodinâmica”, defendida para obtenção de título de doutor em Pesquisa em Urologia, trata-se do primeiro estudo com intenção de avaliar parâmetros urodinâmicos como desfecho primário em pacientes com próstatas > 80 cm³. Após cálculo de tamanho amostral, pacientes foram randomizados para os dois grupos especificados. Com o intuito de não haver fatores confundidores, foi proposto, dentre os critérios de inclusão, avaliar apenas pacientes com boa reserva detrusora e com sinais evidentes de obstrução infravesical. Foram excluídos, portanto, pacientes com sinais de hipoatividade detrusora, parâmetro não levado em consideração nos principais ensaios clínicos em literatura.
“Considerando as evidências atuais, não há estudos prospectivos e randomizados comparando a PAE ao tratamento padrão ouro para próstatas de maior volume. É de suma importância a estratificação prévia do grau de obstrução infravesical, bem como do grau de contração detrusora, por meio de estudo urodinâmico, proporcionando resultados confiáveis em pacientes com perfis semelhantes, característica essa não priorizada em trabalhos publicados na literatura”, destacou Lebani.
Material e métodos
Trata-se de um estudo prospectivo, randomizado, de não-inferioridade, em centro único, conduzido pela Disciplina de Urologia do Departamento de Cirurgia e pelo Departamento de Radiologia da EPM/Unifesp entre o período de janeiro de 2020 a maio de 2022. O recrutamento dos pacientes ocorreu no ambulatório de disfunções miccionais da disciplina de Urologia da EPM/Unifesp, com pacientes provenientes da atenção primária e encaminhados ao serviço.
Uma vez aplicados os critérios de inclusão e exclusão, os pacientes incluídos eram orientados a descontinuar o tratamento medicamentoso ao menos um mês antes do início da avaliação para que não houvesse interferência dos fármacos sobre os resultados obtidos na investigação inicial (baseline) tampouco no seguimento.
Os pacientes foram submetidos à:
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Avaliação clínica: foi realizada por meio de anamnese detalhada, incluindo grau de escolaridade, avaliação dos sintomas, comorbidades, uso de medicações prévias, antecedentes clínicos e cirúrgicos. Para estratificação da gravidade de sintomas, foram utilizados o Escore Internacional de Sintomas prostáticos (IPSS) em relação aos sintomas urinários, o Índice Internacional de Função Erétil (IIEF-5) e o Male Sexual Health Questionnaire (MSHQ), em relação a análise da qualidade de vida sexual.
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Análise laboratorial: análise de perfil hematológico, perfil bioquímico metabólico, função renal, urinálise, níveis de colesterol, glicemia. O nível do antígeno prostático específico (PSA) foi analisado previamente a qualquer tratamento proposto.
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Avaliação radiológica: ultrassonografia prostática transabdominal e ultrassonografia de rins e vias urinárias, com aferição do volume prostático (cm³), resíduo pós-miccional (RPM, em cm³), presença de dilatação do trato urinário inferior, espessamento de parede vesical, presença de trabeculações e divertículos; e a ressonância nuclear magnética da próstata, para avaliação mais adequada do padrão tecidual da glândula e principalmente, para a aferição adequada do volume (aferida por meio de medidas cefalocaudal, transversa e anteroposterior), com menor suscetibilidade a variações decorrentes de métodos examinador dependentes.
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Avaliação urodinâmica: estudo urodinâmico, incluindo urofluxometria livre, cistometria e estudo fluxo-pressão, seguindo as recomendações e boas práticas para a execução do estudo urodinâmico.
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Pacientes com LUTS por APB, refratários a tratamento clínico ou com indicação cirúrgica por algum outro parâmetro, elegíveis ao estudo, foram randomizados aleatoriamente para prostatectomia aberta (OP) ou embolização de artérias prostáticas, sendo ambas as intervenções realizadas nas dependências do Hospital São Paulo, hospital universitário da Unifesp (HSP/HU Unifesp).
O presente estudo analisou de forma per protocol como desfecho primário, a mudança na variável “pico de fluxo urinário” (Qmáx), além de outros parâmetros, em 1, 3, 6 e 12 meses após a intervenção, com enfoque nos resultados obtidos aos 6 meses, período o qual os pacientes foram submetidos a novo estudo urodinâmico e avaliação radiológica.
Dos 85 pacientes elegíveis ao estudo, 37 foram excluídos por não preencherem todos os critérios de inclusão, não concordarem na participação no estudo ou durante a investigação, serem diagnosticados com câncer de próstata. Ao término, 23 pacientes foram submetidos à PAE e 25 à OP.
Os grupos são homogêneos entre si e não apresentaram diferenças significativas nos parâmetros avaliados, sendo comparáveis por critérios clínicos (IPSS, comorbidades, urgência miccional, IMC, uso de sonda), radiológicos (volume prostático, aferição de resíduo pós-miccional), urodinâmicos (Qmáx, indices de obstrução, contratilidade e esvaziamento vesical) e laboratoriais (PSA, níveis de hemoglobina e creatinina). Os 48 pacientes avaliados tinham idade médica de 66,7 ± 6,63 anos, denotando população idosa, com grande prevalência de obstrução infravesical pela hiperplasia prostática benigna.
Resultados
Após terem sido submetidos às intervenções, seguiu-se o protocolo de acompanhamento nos períodos pré-determinados. Os resultados encontrados estão apresentados a seguir.
Na tabela 1, constam os valores de Qmáx ao longo de um ano de seguimento, um dos desfechos primários do presente estudo.
Tabela 1 - Qmáx (média) ± desvio padrão no baseline e nos diversos períodos de seguimento. Imagem: Arquivo Pessoal
Ambos os grupos apresentaram melhora estatística do fluxo urinário em relação ao seu respectivo baseline, embora seja mais evidente e pronunciada no grupo OP, com diferença de 7,8 ml/segundo, conforme figura 1.
Figura 1 - Curva de Qmáx x 12 meses. Imagem: Arquivo Pessoal
Na tabela 2 encontram-se os resultados comparativos após 6 meses de seguimento, momento em que os pacientes foram submetidos a nova avaliação urodinâmica e radiológica, bem como aos testes clínicos.
Tabela 2 - Resultados após 6 meses de intervenção. Imagem: Arquivo Pessoal
Iniciando a exposição descritiva dos resultados, em relação à avaliação clínica comparativa aos 6 meses, não houve diferença significativa de mudança do relato de urgência miccional em ambos os grupos (testada por meio de variável categórica binária). No estudo dos sintomas clínicos, estratificados por meio do IPSS, houve redução média de mais de 15 pontos para os dois grupos, sem diferença significativa entre eles. Na análise do escore de qualidade de vida, houve melhora significativa nas duas populações estudadas, com diferença significativa entre elas, favorecendo o grupo OP.
Em relação ao IIEF-5, não houve diferença significativa no seguimento em ambos os grupos avaliados. Foi verificada queda mais pronunciada do PSA no grupo submetido a enucleação, com diferença significativa. Avaliando-se especificamente o grupo PAE, não houve queda expressiva do PSA, mesmo nos pacientes que apresentaram melhora clínica e fluxométrica.
Aproximadamente 52,2% dos pacientes submetidos a PAE e 44% dos pacientes submetidos a OP estavam em uso de SVD antes das respectivas intervenções. Após os tratamentos propostos, nota-se significativa redução do percentual de pacientes sondados, não havendo predominância de um grupo sobre o outro.
Ponderando os critérios urodinâmicos (exceto pelos resultados de aferição fluxométrica já apresentados), os parâmetros de obstrução infravesical se mantiveram no grupo PAE, com diferença significativa entre os braços. Neste grupo, nota-se uma queda discreta da pressão detrusora no fluxo máximo (PDetQmax). Em contrapartida, houve redução significativa da PDetQmax no grupo OP. Por consequência inerente ao cálculo dos índices, o mesmo comportamento foi observado na análise do BOOI.
Ao analisar as hiperatividades detrusoras durante a cistometria, verificou-se que após 6 meses de seguimento, 60,9% dos participantes apresentaram contrações involuntárias no grupo PAE, sem diferença significativa. Já no grupo OP, houve redução das contrações involuntárias, ocorrendo em 30% dos pacientes após 6 meses de seguimento, com diferença significativa.
No que diz respeito à aferição do RPM aos 6 meses (analisado por cateterismo uretral), houve redução satisfatória nos dois grupos, sem diferença significativa entre eles. O mesmo resultado foi corroborado ao mensurar o RPM por método ultrassonográfico.
Analisando parâmetros radiológicos, encontrou-se redução de média de 20,6% no volume prostático aferido por RNM no grupo PAE comparado ao baseline, com significância estatística. Adicionalmente, na comparação entre os grupos, há diferença estatística em relação a redução do volume prostático, com predomínio do grupo OP sobre o grupo PAE.
Segurança e Eventos Adversos
No braço PAE, um paciente apresentou úlceras de pênis (manifesta por vários pontos escurecidos difusos em glande e corpo), autolimitada, com resolução após duas semanas com medidas clínicas. Além disso, quatro pacientes apresentaram hematoquezia de pequena magnitude (nesse grupo encontrava-se o mesmo paciente com úlcera de pênis), um paciente evoluiu com infecção do trato urinário, três apresentaram hematúria leve no pós operatório imediato, sem necessidade de irrigação e cinco evoluíram com hematoespermia no primeiro mês. 8,7% dos pacientes tiveram síndrome pós embolização, tratados com antiinflamatórios e analgésicos, com necessidade de persistência de SVD por 2 semanas. A evolução foi auto-limitada.
No grupo OP, 11 pacientes manifestaram hematúria durante as primeiras quatro semanas de pós operatório, sendo que em três pacientes houve necessidade de transfusão sanguínea no perioperatório. Dois apresentaram complicações cardiovasculares. Sete evoluiram com hematoespermia após um mês de avaliação e dois evoluiram com ITU no pós operatório. Um paciente apresentou incontinência urinária de esforço transitória, que persistiu até o 6º mês, com retomada de continência e um evoluiu com esclerose de loja prostática.
Na avaliação da dor, estratificada por nota variando de 0 a 10 (sendo 10 a maior dor já sentida pelos pacientes), foi considerado relevante aqueles que referiam intensidade ≥ 6. Apesar da ausência de diferença estatística entre os grupos, houve tendência de maior quadro álgico nos pacientes do grupo PAE.
A tabela 3 e a figura 2 resumem a incidência dos principais eventos adversos encontrados por grupo.
Tabela 3 - Eventos Adversos por grupo. Imagem: Arquivo Pessoal
Os pacientes submetidos a PAE tiveram menor tempo de internação comparados ao grupo controle. Já em relação ao tempo de sonda, não houve diferença entre os grupos.
Na alta hospitalar, 47,8% e 100% dos pacientes foram liberados com uso de sonda vesical de demora no grupo PAE e OP, respectivamente. Em 17,3% (4 pacientes) do grupo experimental não obteve-se a retirada do cateter com sucesso após duas tentativas. Dois pacientes tiveram sucesso na retirada do cateter na terceira tentativa. Houve falência de tratamento em 8,7% dos pacientes no braço PAE.
Figura 2 - Eventos Adversos por grupo. Imagem: Arquivo Pessoal
Em relação a ejaculação retrógrada (aferida por meio de variável categórica e estratificada em intensidade pelas questões 7,8 e 9 do questionário de saúde sexual masculina), foi investigado o efeito das intervenções nos pacientes que não manifestavam o sintoma antes dos respectivos tratamentos (PAE = 15/23 pacientes ; OP = 24/25 pacientes). Não houve diferença desse parâmetro aos 12 meses em relação ao baseline no grupo PAE. Já no grupo OP, a queixa foi significativa após 12 meses da intervenção. Comparando-se os dois subgrupos, houve diferença significativa da taxa, com predomínio do grupo OP sobre o grupo PAE.
Segundo o médico urologista, "este estudo forneceu dados confiáveis mostrando diferença notória entre o tratamento cirúrgico e o percutâneo, no que diz respeito ao mecanismo fisiopatológico da obstrução infravesical. Há de se reconhecer que os valores elevados de desvio padrão no estudo representam uma população ainda heterogênea. Assim sendo, análises de subgrupo seriam oportunas para investigar eventual parcela que se beneficiaria em maior magnitude da embolização de artérias prostáticas (PAE)".
A tese “Ensaio clínico randomizado comparativo entre Embolização de Artérias prostáticas e Prostatectomia Aberta em próstatas de grande volume (>80 ml): análise clínica e urodinâmica” pode ser lida neste link.
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