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Pesquisa da Unifesp avalia o letramento em saúde de cuidadores(as) de crianças

Publicado: Segunda, 20 de Março de 2023, 13h16 | Última atualização em Segunda, 27 de Março de 2023, 09h16 | Acessos: 7201

Compreensão sobre as informações fornecidas pelos(as) médicos(as) é fundamental para melhores decisões em relação aos cuidados básicos em saúde

 

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Por Juliana Narimatsu

Já parou para pensar que a nossa compreensão sobre os serviços básicos em saúde pode refletir nas decisões que tomamos sobre nossa própria vida saudável e sobre os cuidados médicos que buscamos? Aliás, não só para nós, mas também para nossos(as) dependentes? Uma pesquisa da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) avaliou exatamente isso: o letramento em saúde (LS) de cuidadores(as) de crianças e suas possíveis associações com os desfechos relacionados a cuidados básicos em saúde.

Letramento em saúde implica nessa capacidade de obter, processar e compreender as informações, sobretudo aquelas fornecidas pelos(as) médicos(as), e os serviços básicos em saúde para, com isso, realizar decisões pertinentes sobre sua própria saúde e a daquele(s/a/as) por quem você é responsável. Vale, portanto, o seu entendimento sobre sinais e sintomas de doenças comuns, doses medicamentosas, meios de disseminação, até métodos de prevenção e tratamento.

Diante dessa temática, a estudante em Medicina Graziele Leite dos Santos desenvolveu seu estudo, sob orientação de Daisy Maria Machado, professora adjunta da Disciplina de Infectologia Pediátrica da Escola Paulista de Medicina (EPM/Unifesp) - Campus São Paulo. Foram convidados(as) 63 cuidadores(as) de crianças que frequentam o Centro de Atendimento da Disciplina de Infectologia Pediátrica (Ceadipe) a responderem um questionário sociodemográfico e a participarem de dois instrumentos de avaliação de LS. Ao mesmo tempo, houve a coleta de dados referentes aos(às) pacientes pediátricos(as), como peso, estatura, índice de massa corpórea (IMC), vacinação, procura do serviço médico por intercorrências e número de internações nos últimos 12 meses.

“Nos interessava saber se o letramento em saúde é uma questão preocupante em nosso serviço e quais suas possíveis repercussões no cuidado de pacientes pediátricos(as), possibilitando a busca de estratégias para minimizar desfechos negativos nessa população”, explica Machado. “É um estudo importante para melhoria no atendimento pelos(as) profissionais da saúde”.

Avaliação do letramento em saúde

No total, 50 cuidadores(as) fizeram parte da pesquisa. Quando submetidos(as) ao primeiro instrumento de avaliação (Escala em Letramento em Saúde), 60,4% dos(as) cuidadores(as) foram classificados(as) como tendo um letramento bom e 39,6% com letramento ruim. Já no segundo instrumento (Questionário STOFHLA), cerca de 73% foram qualificados(as) com letramento adequado e 12%, inadequado.

Além da diferença nos resultados conforme o instrumento, vale destacar que alguns(mas) dos(as) participantes considerados(as) com letramento ruim na primeira avaliação, tiveram como resultado adequado na segunda,63,2% deles(as).

“O Questionário STOFHLA avalia a capacidade de leitura e compreensão de texto, além da lógica. Já na Escala de Letramento em Saúde, vemos que as perguntas refletem não apenas na necessidade de compreensão da informação pelo(a) receptor(a), mas também uma dependência da capacidade do(a) emissor(a) de passar a mensagem com clareza”, explica Santos. “O indivíduo pode sair com dúvidas não por ter baixa escolaridade, mas, sim, porque o(a) profissional realizou a explicação de algo com jargões de difícil compreensão ou sequer indagou se a pessoa tinha alguma pergunta a fazer. Nesses casos, a dificuldade seria do(a) profissional”, complementa.

A pesquisadora ressalta ainda que a desistência de 13 cuidadores(as) também foi um limitador do estudo, já que aconteceu após a explicação de como seria sua participação na pesquisa, com a aplicação dos questionários e a avaliação do desfecho sobre os(as) pacientes atendidos(as) no ambulatório. “O fato de alguns cuidadores(as) se recusarem a participar pode evidenciar um viés de seleção, onde as pessoas com mais dificuldade e menor escolaridade sejam oas que se sintam mais constrangidos(as) em se exporem”.

Classe social e grau de escolaridade: reflexos no LS

Do total de cuidadores(as), a maioria pertence à classe C, cerca de 67%, de acordo com a Associação Brasileira de Estudos Populacionais (Abep), e possuem até o ensino fundamental 2 completo (49%). Tais características, diferente das demais, como raça, estado civil e qual a relação parental ou não com o(a) paciente pediátrico, estão aqui destacadas, já que trouxeram associações significativas com os resultados em letramento em saúde.

Os(As) participantes que são da classe D e E, 14% do total de cuidadores(as), sendo 66,6% desses(as) com letramento ruim, tiveram como resultado um letramento em saúde proporcionalmente pior quando comparados(as) às classes B e C, que representam 86% do total, sendo 29,7% desses(as) com letramento ruim. Foi observado também que a escolaridade com letramento ruim está presente mais no grupo com até o ensino fundamental 1 incompleto ou completo, cerca de 61,1% do total de participantes. “Tal achado não nos causa estranheza”, reflete Santos. “Isso revela as iniquidades da nossa sociedade, gerando um ciclo vicioso: aqueles(as) com menor escolaridade, ganham menos, precisam trabalhar mais pelo sustento, têm menos chances de estudar, atingem menor escolaridade… e o círculo se fecha.”

Letramento em saúde: desfechos nos cuidados básicos com as crianças

Diferentemente de outros estudos sobre LS, em que pessoas com baixo letramento são menos propensas a usar serviços de saúde, possuem menos conhecimento sobre doenças crônicas e sua gestão ou tendem a realizar visitas evitáveis a hospitais e com maior utilização dos serviços de emergência, os(as) pacientes pediátricos(as) dependentes dos(as) seus(suas) cuidadores(as) que foram avaliados(as) nesse estudo não tiveram essa identificação.

Mesmo os(as) participantes considerados(as) com letramento em saúde ruim, independente do instrumento de avaliação aplicado, não obtiveram maior porcentagem nos desfechos vistos como negativos. A maioria dos(as) pacientes pediátricos(as), mais de 85%, estava com a situação vacinal em dia. Também não foram apresentadas alterações no estado nutricional (mais de 75% classificadas como eutróficas) entre as crianças ou mais buscas pelo serviço médico, ou mesmo maiores números de internações.

Santos pontua que é importante perceber que características como estresse ou privação do sono são alguns fatores que devem ser levados em consideração ao avaliar o resultado do letramento em saúde dos(as) pacientes ou de seus(as) responsáveis. “O letramento e os desfechos de saúde estão relacionados também por vias não causais e são necessários estudos que avaliem quais intervenções reduzem efetivamente as disparidades relacionadas ao letramento em saúde”, pontua.

Atenção do(a) profissional sob o letramento em saúde

Diante dos resultados, vale o alerta aos(às) profissionais, gestores(as) de saúde e estudantes para desenvolverem um olhar para o tema e criar intervenções e materiais para melhorar o conhecimento e inclusão. “É um direito do(a) cidadão(ã) participar, entender e se envolver no processo de manutenção de sua saúde”, reforça Santos. “A menos que as pessoas entendam como seguir as recomendações dos(as) profissionais, os benefícios dos avanços científicos feitos na prevenção e gerenciamento das doenças não serão percebidos e as disparidades nos resultados ficarão exacerbadas”, finaliza.

O Centro de Atendimento da Disciplina de Infectologia Pediátrica (Ceadipe) é vinculado ao Departamento de Pediatria da Escola Paulista de Medicina (EPM/Unifesp) - Campus São Paulo. Tal pesquisa foi um projeto de iniciação científica apresentada no Congresso Acadêmico da universidade no ano de 2022.

 

Fonte: DCI/Unifesp

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