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Boca e olhos secos? Isso pode ser síndrome de Sjögren

Publicado: Sexta, 22 de Julho de 2022, 22h07 | Última atualização em Sexta, 22 de Julho de 2022, 23h44 | Acessos: 46169

Saiba tudo sobre a doença autoimune que afeta as glândulas produtoras de lágrimas e saliva, causando secura nos olhos e na boca

A síndrome de Sjögren (SSj) é uma doença reumática inflamatória crônica, de evolução lenta, que compromete predominantemente as glândulas lacrimais e salivares. Ocorre em até 0,4% da população, com predomínio em mulheres acima dos 40 anos e sua frequência aumenta com a idade. É caracterizada por invasão das glândulas lacrimais e salivares por linfócitos, ocasionando progressiva distorção e destruição local, o que acarreta diminuição na quantidade e na qualidade de lágrima e saliva produzidas por essas glândulas. Embora a sua causa não esteja determinada, sabemos que há hiperatividade de linfócitos B, um dos tipos de células do sistema imunitário, havendo produção de autoanticorpos, ou seja, anticorpos que reagem contra moléculas do próprio organismo. Existe também uma predisposição genética, pois parentes do primeiro grau de pacientes com SSj têm maior chance de desenvolver SSj ou outras doenças autoimunes.

Sjogrens syndrome causes symptoms risk factors and complicationsFonte: Sound Health and Lasting Wealth

Sintomas

Os sintomas dependem da intensidade da doença, variando de sintomas leves a quadros mais intensos. Pode haver sintomas gerais, como astenia, fadiga, febrícula, dores articulares e falta de apetite. Porém, as manifestações clínicas mais características e mais frequentes são decorrentes da falta de saliva e lágrima.

A saliva auxilia na deglutição e fala, protege a gengiva e os dentes, ajudando também a combater microrganismos nocivos. A diminuição na quantidade e qualidade da saliva favorece mudança na flora bacteriana da boca, desenvolvimento de gengivite, candidíase oral (sapinho) e cáries dentárias. Pode ocorrer também dificuldade para engolir, sensação de queimação na boca e mau hálito.

A lágrima é importante para nutrição da conjuntiva e córnea, lubrificação do olho e remoção de pequenas partículas, além de ter função antimicrobiana. Com a diminuição da quantidade e qualidade da lágrima, ocorre vermelhidão, coceira, sensação de queimação e de corpo estranho no olho e visão embaçada.

O quadro de olho seco (xeroftalmia) e boca seca (xerostomia) é conhecido como síndrome seca, ou síndrome sicca. É importante salientar que há outras causas comuns de diminuição da secreção salivar e lacrimal, como idade avançada, uso de medicamentos (antidepressivos, anti-hipertensivos), distúrbios hormonais e clima seco.

Ademais, pode haver acometimento de glândulas sudoríparas e sebáceas da pele, ocasionando ressecamento cutâneo com prurido (coceira). O comprometimento das mucosas pode levar a secura das vias aéreas, acarretando tosse seca persistente e maior suscetibilidade a infecções. Pode haver também ressecamento vaginal, levando a irritação, prurido e dor à relação sexual (dispareunia).
A infiltração das glândulas salivares pode aumentar o volume das glândulas parótidas, ocasionando um inchaço na região do rosto logo a frente das orelhas, semelhante ao que ocorre na caxumba. Pode haver também aumento de volume dos linfonodos, ocasionando quadros semelhantes a “ínguas”, porém em geral não dolorosos.

Há formas mais graves da doença, com envolvimento de órgãos internos, vasos sanguíneos e nervos. Pode ocorrer invasão de linfócitos nos pulmões, ocasionando tosse e progressiva falta de ar. Alguns pacientes apresentam inflamação de pequenas articulações das mãos e punhos, com aumento de volume e dor. Também podem ser acometidos nervos periféricos, ocasionando quadros de dormência ou sensação de queimação nos pés, pernas, mãos e braços. Na pele podem ocorrer pequenas e numerosas manchas que se assemelham a picadas de pulga, principalmente nas pernas, e que refletem a inflamação de pequenos vasos sanguíneos da pele. Em alguns casos os linfócitos podem se acumular no tecido renal, provocando alterações na função renal.

Associação com outras doenças

Em alguns casos, a síndrome de Sjögren está associada a outras doenças reumáticas sistêmicas, como a artrite reumatóide, lúpus ou esclerodermia, ampliando o conjunto de sintomas dos pacientes. Pode também estar associada a doenças inflamatórias da tireoide (tireoidite de Hashimoto) e fígado (colangite biliar primária, hepatite autoimune). Uma pequena fração dos pacientes pode apresentar proliferação descontrolada de linfócitos, invadindo linfonodos e vários órgãos, com transformação para linfoma.

Por apresentar possibilidade de manifestações variadas, mais leves ou mais graves, os pacientes devem ser cuidadosamente monitorados mediante consultas e exames periódicos. Dessa forma, eventuais complicações podem ser identificadas e tratadas precocemente.

Tratamento

Não há tratamento curativo no momento, por não conhecermos a causa da doença. É importante evitar fatores de agravamento da secura e utilizar medidas para melhorar a hidratação da pele e mucosas. Para os olhos, recomendam-se colírios de lágrima artificial várias vezes ao dia. Óculos grandes e curvos podem ser úteis, ao criarem uma proteção contra a evaporação da lágrima. Para a boca, é fundamental uma higiene dental redobrada para evitar a proliferação bacteriana e as cáries. Consultas frequentes ao dentista são necessárias. Hidratação frequente em pequenas quantidades é útil para manter a boca úmida. Medicamentos que estimulam a secreção de saliva e lágrimas têm ação limitada, mas podem ajudar alguns pacientes. Para a pele, recomenda-se o uso de cremes hidratantes, bem como gel para o ressecamento vaginal. Nos casos mais graves, com envolvimento de vários órgãos, são utilizados medicamentos sistêmicos, como imunossupressores e imunomoduladores. 


luis eduardo coelho andradeLuís Eduardo Coelho Andrade

Professor da Disciplina de Reumatologia do Departamento de Medicina da Escola Paulista de Medicina - EPM/Unifesp

É graduado em Medicina pela Universidade Federal de Minas Gerais (1980), tem residência em Medicina Interna pelo Hospital das Clínicas da FM-USP de Ribeirão Preto (1982) e especialização em Reumatologia pela Escola Paulista de Medicina (1984). Tem doutorado em Medicina (Reumatologia) pela Universidade Federal de São Paulo (1987). Tem pós-doutoramento em Biologia Molecular dos Autoantígenos pelo Scripps Research institute (1989-1991). É Livre Docente pela EPM/Unifesp desde 1995. Tem título de especialista em Reumatologia pela SBR em 1984 e em Patologia Clínica pela SBPC em 2005. É Professor Associado na Disciplina de Reumatologia da Universidade Federal de São Paulo e chefe do Laboratório de Imuno-Reumatologia nessa instituição. É membro da Comissão de Laboratório da Sociedade Brasileira de Reumatologia. Entre 2010 a 2015 foi presidente do Comitê de Padronização de Autoanticorpos, subcomitê da IUIS (International Union of Immunology Societies). Desde 2014, é coordenador do International Consensus on ANA Patterns (ICAP). Desde 2011 é membro do European Autoantibody Standardizing Initiative (EASI). Tem sido membro do Comitê Assessor da Medicina II na CAPES por sucessivas rodadas nas décadas de 1990, 2000, 2010 e atualmente. Foi coordenador da Área Saúde I da FAPESP no período de 2011 a 2018. Em 2017 assumiu o cargo de Chairman do Quality Assessment and Standadization Committee da IUIS. É Consultor Médico em Imunologia e Reumatologia no Laboratório Fleury. Tem experiência na área de Medicina, com ênfase em Reumatologia, atuando principalmente nos seguintes temas: auto-anticorpos, estudo in vivo da microcirculação, polimorfismo gênico, expressão gênica, fisiopatologia das doenças autoimunes, interface entre imunodeficiência e autoimunidade, esclerose sistêmica, lúpus eritematoso sistêmico, síndrome de Sjögren, doenças reumáticas autoimunes e artrite reumatoide.

 

 

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